quarta-feira, 28 de dezembro de 2016

mapa do cosmos

desde então, nunca mais dormiu uma só noite sem ele,
sonhava com as estrelas catalogadas pelas mulheres que já se foram,
e a luz emitida e o calor medido pelos abraços
era a chave para a compreensão da formação das estrelas, 
sua pulsação e a dele irradiavam o tamanho do cosmos
que abraçava todas as mulheres que já se foram
e numa só noite, sonhou  todas as noites, 
que com ele dormia




domingo, 18 de dezembro de 2016

já não há tres dimensões, altura largura e profundidade,
quando criança havia de meu olhar tudo isto,
agora o tempo zune enquanto cantas,
delicadamente deixas tua semente neste domingo abafado,
escuto num pedaço de saigon

segunda-feira, 12 de dezembro de 2016

atrás de cada palavra
luz
(pulo dois passos)
na sombra
(passo)
o desejo





quarta-feira, 7 de dezembro de 2016

mantra

anda menina, ​reencontra a leveza,
respira a flor, bebe o vinho bom
faz amor,
aceita o presente, a dádiva,
não há certezas,
a vida e suas diferenças passam,  
palavras caladas vão
não voltam, palavras são
sons musicais
não voltam mais, se soltam no cais
ouve menina, espera menina,
há uma canção
é tua, áspera menina
escuta sem susto 
as diferenças ensinam
gestos todos os dias, todas as noites
todo o sol e lua,
toda luz, toda sombra,
estrelas clareiam, margeiam, guiam,
se extinguem,
dádivas são 


quinta-feira, 1 de dezembro de 2016

sabe o que o ratinho disse para a cinderela? o maior risco é nos vermos como nós somos. Escutando isto, fugiu do reino antes de experimentar o sapatinho fatídico. Não seria princesa do príncipe, pois havia lido oscar wilde e ele fora claro. Dizia pra sonhar um sonho bem grande, mas bem grande mesmo, porque assim poderia seguir pela vida a fora sem perdê-lo de vista. Foi pela estrada até se tornar um pontinho solto na paisagem. Fim da primeira parte.
…"De que afetos você é capaz? Experimente, mas é preciso muita prudência para experimentar. Vivemos em um mundo desagradável, onde não apenas as pessoas, mas os poderes estabelecidos têm interesse em nos comunicar afetos tristes. A tristeza, os afetos tristes são todos aqueles que diminuem nossa potência de agir. Os poderes estabelecidos têm necessidade de nossas tristezas para fazer de nós escravos. O tirano, o padre, os tomadores de almas, têm necessidade de nos persuadir que a vida é dura e pesada." dizia Delleuze, o grilo falante, ao pé do ouvido da caminhante, outrora Cinderela. Não havia mais cinza, e sim o pó da estrada e uma estranha alegria, e uma estranha tristeza. Não era tão fácil... "Os poderes têm menos necessidade de nos reprimir do que de nos angustiar...A longa lamentação universal sobre a vida: a falta-de-ser que é a vida…"

"Por mais que se diga "dancemos", não se fica alegre. Por mais que se diga "que infelicidade a morte", teria sido preciso viver para ter alguma coisa a perder. "

quarta-feira, 23 de novembro de 2016

dance, dance de rosto colado de alma lavada menina levada não esqueça de rodopiar no intervalo do um, dois tres quatro enrole, desenrole abrace a música se deixe levar

quinta-feira, 17 de novembro de 2016

chove devagarinho, então não quero falar do presente, só do passado.
onde é que tu anda, passado?
vem me abraçar novamente, já não tenho mais tanto medo





















quarta-feira, 16 de novembro de 2016

lusitana se fez a língua
de novo, novinha, lustrosa
bebe no rio eterno, na casa sagrada

do tempo se fez a fala
urgente de toda outra palavra

da margem se fez caminho
traçado formigando no mapa


do espaço, se fez a luta
nele abraço mortos,
canga e o limo
que a fina praia índica lamina










exuberante jardim
faço de tudo, 
e de nada:
debocha de mim!
sabe a rosa que cala
na mão errada, espinha?
é assim, água de beber
terra de colher,
leio folhas, linhas cabais
desatinos hão de rolar
antes da meia lua,
chuva de sementes
chove chuvinha,
andarei na sombra,
na sombra descansa a luz

sábado, 12 de novembro de 2016

gosto de incêndios
a paz, é cinza
no esquecimento








recebi pedido de inimizade
já não sou unanimidade
desisto da mediocridade

domingo, 6 de novembro de 2016

novembro vai passar inteiro
de um a trinta, aposto
palavras enlaço, não largo
ainda estranho o suspiro preso
atado no arco, alvo certeiro,
se a flecha alcança o que gosto
e o desejo acena tudo que apago,
partilho o peso
do aço que tenho no peito
que corta e lembra









quinta-feira, 3 de novembro de 2016

esta noite sonhei com o Chico Buarque
em vez de lavar louça vou sair pra caminhar
moreno vem me salvar deste mundo de araque
que estou a inventar
tudo por causa do face, da rede, do conhaque
tudo por causa do sonho que sonhava,
moreno vem me ocupar, tu é meu destaque
ta faltando arroz, leite e sabão,
na escola tem filho exemplar,
e o exemplo é a escolha, vou sair pra caminhar

esta noite sonhei com o Chico Buarque
estava a me cantar morena dos olhos d'água
não sou morena, nem ana de amsterdã, sou tua claque
mulher de almanaque, de forno e fogão
que sabe a duras penas quanto custou atenas
por debaixo das saias, quanto ataque
em vez de lavar roupa vou sair pra redenção
vou com a manada ocupar lugar de humano
deixei louça na pia, café passado e pão
vou sair pra caminhar


segunda-feira, 31 de outubro de 2016

levo a morte todo dia a passear
no parque, no café, nas noites de luar
animal estimado de bote certeiro,
nem coleira, 
livre, vai comigo porque quer, 
não há enganos entre nós, 
nem promessas
andamos libertas, sem rodeios 
temos uma a outra, como garantia
sem golpes, confiamos nos belos dias
e nos divertimos como vadias
a cada galanteio, generosa,
envia pequenas mortes
a cada novo amor, 
e me encanto
corro nua então, 
dou saltos mortais
sou sua, única e leal,
ainda, no fim, recebo rosas





de peito aberto
chamaste meu nome
dormi no corpo certo





acordei no corpo errado
dei por mim
virando pro lado

sábado, 29 de outubro de 2016

exaspero porque desespero
nada sério, além de belo e real
olhar de novo, olhar novo
simular que nada desfaz
as noites de março
nos dias de abril
e maios, onde fores
pois junhos e julhos
ausentes
guardam calor
pros setembros em flor
pros outubros
juntos






quinta-feira, 27 de outubro de 2016

desatenda-se o sujeito
até o sentimento ser verbo





desatenta ao pudor
mostrou partes queridas






segunda-feira, 24 de outubro de 2016

neste banco de jardim de todo dia,
xícara na mão, sabiá no galho
o destino se desata,
estanca o caminho da formiga
com a queda da flor do abacateiro,

não mais será fruto nem confirmação de rainha,
na coroa venta, sem  previsão de chuva,
desanda nuvem, sol que arde, som de buzina
mistura toada de bem-te-vi com o martelo do vizinho,
luz uma faísca no muro branco,
tem uma chance da paz ser caminho

neste sul de folhas, a respiração vem do chão,
todas as casas sacodem seus danos,
no meio fio, no fim da rua, levantam homens,
sacos plásticos, panos, espelhos na calçada,
o desatino de se mirar no reflexo humano





era domingo, a primavera mordia a madrugada
e a lua minguava no céu morno de outubro,
não,
era segunda, recém nascida,
cara lavada na sombra
escondida da chuva,
não,
era eu, esperava um sinal, uma brisa, um adeus
e a imensa noite que não saia de mim







Onde Estivestes de Noite



"As histórias não têm defeito" Alberto Dines"O desconhecido vicia" Fuazi Arap"Sentado na poltrona, com a boca cheia de dentes esperando a morte" Raul Seixas"O que vou anunciar é tão novo que receio ter todos os homens por inimigos, a tal ponto se enraízam no mundo os preconceitos e as doutrinas, uma vez aceitas"William Harvey


A noite era uma possibilidade excepcional. Em plena noite fechada de um verão escaldante um galo soltou seu grito fora de hora e uma só vez para alertar o início da subida pela montanha. A multidão embaixo aguardava em silêncio.
Ele-ela já estava presente no alto da montanha, e ela estava personalizada no ele e o ele estava personalizado no ela. A mistura andrógina criava um ser tão terrivelmente belo, tão horrorosamente estupefaciente que os participantes não poderiam olhá-lo de uma só vez: assim como uma pessoa vai pouco a pouco se habituando ao escuro e aos poucos enxergando. Aos poucos enxergavam o Ela-ele e quando o Ele-ela lhes aparecia com uma claridade que emanava dela-dele, eles paralisados pelo que é Belo diriam: "Ah, Ah". Era uma exclamação que era permitida no silêncio da noite. Olhavam a assustadora beleza e seu perigo. Mas eles haviam vindo exatamente para sofrer o perigo.
[...]
Aquela que de noite gritava "estou em espera, em espera", de manhã, toda desgrenhada disse para o leite na leiteira que estava no fogo:
- Eu te pego, seu porcaria! Quer ver se tu te mancas e ferves na minha cara, minha vida é esperar. É sabido que se eu desviar um instante o olhar do leite, esse desgraçado vai aproveitar para ferver e entornar. Como a morte que vem quando não se espera.
Ela esperou, esperou e o leite não fervia. Então, desligou o gás.
No céu o mais leve arco-íris: era o anúncio. A manhã como uma ovelha branca. Pomba branca era a profecia. Manjedoura. Segredo. A manhã preestabelecida. Ave-Maria, gratia plena, dominus tecum. Benedicta tu in mulieribus et benedictum frutus ventri tui Jesus. Sancta Maria Mater Dei ora pro nobis pecatoribus. Nunca et ora nostrae morte Amem.
Padre Jacinto ergueu com as duas mãos a taça de cristal que contém o sangue escarlate de Cristo. Eta, vinho bom. E uma flor nasceu. Um flor leve, rósea, com perfume de Deus. Ele-ela há muito sumira do ar. A manhã estava límpida como coisa recém-lavada.
AMÉM
Os fiéis distraídos fizeram o sinal da Cruz.

AMÉM
DEUS
FIM

Epílogo:
Tudo o que escrevi é verdade e existe. Existe uma mente universal que me guiou. Onde estivestes de noite? Ninguém sabe. Não tentes responder - pelo amor de Deus. Não quero saber da resposta. Adeus. A-Deus.

sexta-feira, 21 de outubro de 2016

clarice lispector

 PERDOANDO DEUS
Eu ia andando pela Avenida Copacabana e olhava distraída edifícios, nesga de mar, pessoas, sem pensar em nada. Ainda não percebera que na verdade não estava distraída, estava era de uma atenção sem esforço, estava sendo uma coisa muito rara: livre. Via tudo, e à toa. Pouco a pouco é que fui percebendo que estava percebendo as coisas. Minha liberdade então se intensificou um pouco mais, sem deixar de ser liberdade.
Tive então um sentimento de que nunca ouvi falar. Por puro carinho, eu me senti a mãe de Deus, que era a Terra, o mundo. Por puro carinho mesmo, sem nenhuma prepotência ou glória, sem o menor senso de superioridade ou igualdade, eu era por carinho a mãe do que existe. Soube também que se tudo isso “fosse mesmo” o que eu sentia – e não possivelmente um equívoco de sentimento – que Deus sem nenhum orgulho e nenhuma pequenez se deixaria acarinhar, e sem nenhum compromisso comigo. Ser-Lhe-ia aceitável a intimidade com que eu fazia carinho. O sentimento era novo para mim, mas muito certo, e não ocorrera antes apenas porque não tinha podido ser. Sei que se ama ao que é Deus. Com amor grave, amor solene, respeito, medo e reverência. Mas nunca tinham me falado de carinho maternal por Ele. E assim como meu carinho por um filho não o reduz, até o alarga, assim ser mãe do mundo era o meu amor apenas livre.
E foi quando quase pisei num enorme rato morto. Em menos de um segundo estava eu eriçada pelo terror de viver, em menos de um segundo estilhaçava-me toda em pânico, e controlava como podia o meu mais profundo grito. Quase correndo de medo, cega entre as pessoas, terminei no outro quarteirão encostada a um poste, cerrando violentamente os olhos, que não queriam mais ver. Mas a imagem colava-se às pálpebras: um grande rato ruivo, de cauda enorme, com os pés esmagados, e morto, quieto, ruivo. O meu medo desmesurado de ratos.
Toda trêmula, consegui continuar a viver. Toda perplexa continuei a andar, com a boca infantilizada pela surpresa. Tentei cortar a conexão entre os dois fatos: o que eu sentira minutos antes e o rato. Mas era inútil. Pelo menos a contigüidade ligava-os. Os dois fatos tinham ilogicamente um nexo. Espantava-me que um rato tivesse sido o meu contraponto. E a revolta de súbito me tomou: então não podia eu me entregar desprevenida ao amor? De que estava Deus querendo me lembrar? Não sou pessoa que precise ser lembrada de que dentro de tudo há o sangue. Não só não esqueço o sangue de dentro como eu o admiro e o quero, sou demais o sangue para esquecer o sangue, e para mim a palavra espiritual não tem sentido, e nem a palavra terrena tem sentido. Não era preciso ter jogado na minha cara tão nua um rato. Não naquele instante. Bem poderia ter sido levado em conta o pavor que desde pequena me alucina e persegue, os ratos já riram de mim, no passado do mundo os ratos já me devoraram com pressa e raiva. Então era assim?, eu andando pelo mundo sem pedir nada, sem precisar de nada, amando de puro amor inocente, e Deus a me mostrar o seu rato? A grosseria de Deus me feria e insultava-me. Deus era bruto. Andando com o coração fechado, minha decepção era tão inconsolável como só em criança fui decepcionada. Continuei andando, procurava esquecer. Mas só me ocorria a vingança. Mas que vingança poderia eu contra um Deus Todo-Poderoso, contra um Deus que até com um rato esmagado poderia me esmagar? Minha vulnerabilidade de criatura só. Na minha vontade de vingança nem ao menos eu podia encará-Lo, pois eu não sabia onde é que Ele mais estava, qual seria a coisa onde Ele mais estava e que eu, olhando com raiva essa coisa, eu O visse? no rato? naquela janela? nas pedras do chão? Em mim é que Ele não estava mais. Em mim é que eu não O via mais.
Então a vingança dos fracos me ocorreu: ah, é assim? pois então não guardarei segredo, e vou contar. Sei que é ignóbil ter entrado na intimidade de Alguém, e depois contar os segredos, mas vou contar – não conte, só por carinho não conte, guarde para você mesma as vergonhas Dele – mas vou contar, sim, vou espalhar isso que me aconteceu, dessa vez não vai ficar por isso mesmo, vou contar o que Ele fez, vou estragar a Sua reputação.
… mas quem sabe, foi porque o mundo também é rato, e eu tinha pensado que já estava pronta para o rato também. Porque eu me imaginava mais forte. Porque eu fazia do amor um cálculo matemático errado: pensava que, somando as compreensões, eu amava. Não sabia que, somando as incompreensões, é que se ama verdadeiramente. Porque eu, só por ter tido carinho, pensei que amar é fácil. É porque eu não quis o amor solene, sem compreender que a solenidade ritualiza a incompreensão e a transforma em oferenda. E é também porque sempre fui de brigar muito, meu modo é brigando. É porque sempre tento chegar pelo meu modo. É porque ainda não sei ceder. É porque no fundo eu quero amar o que eu amaria – e não o que é. É porque ainda não sou eu mesma, e então o castigo é amar um mundo que não é ele. É também porque eu me ofendo à toa. É porque talvez eu precise que me digam com brutalidade, pois sou muito teimosa. É porque sou muito possessiva e então me foi perguntado com alguma ironia se eu também queria o rato para mim. É porque só poderei ser mãe das coisas quando puder pegar um rato na mão. Sei que nunca poderei pegar num rato sem morrer de minha pior morte. Então, pois, que eu use o magnificat que entoa às cegas sobre o que não se sabe nem vê. E que eu use o formalismo que me afasta. Porque o formalismo não tem ferido a minha simplicidade, e sim o meu orgulho, pois é pelo orgulho de ter nascido que me sinto tão íntima do mundo, mas este mundo que eu ainda extraí de mim de um grito mudo. Porque o rato existe tanto quanto eu, e talvez nem eu nem o rato sejamos para ser vistos por nós mesmos, a distância nos iguala. Talvez eu tenha que aceitar antes de mais nada esta minha natureza que quer a morte de um rato. Talvez eu me ache delicada demais apenas porque não cometi os meus crimes. Só porque contive os meus crimes, eu me acho de amor inocente. Talvez eu não possa olhar o rato enquanto não olhar sem lividez esta minha alma que é apenas contida. Talvez eu tenha que chamar de “mundo” esse meu modo de ser um pouco de tudo. Como posso amar a grandeza do mundo se não posso amar o tamanho de minha natureza? Enquanto eu imaginar que “Deus” é bom só porque eu sou ruim, não estarei amando a nada: será apenas o meu modo de me acusar.Eu, que sem nem ao menos ter me percorrido toda, já escolhi amar o meu contrário, e ao meu contrário quero chamar de Deus. Eu, que jamais me habituarei a mim, estava querendo que o mundo não me escandalizasse. Porque eu, que de mim só consegui foi me submeter a mim mesma, pois sou tão mais inexorável do que eu, eu estava querendo me compensar de mim mesma com uma terra menos violenta que eu. Porque enquanto eu amar a um Deus só porque não me quero, serei um dado marcado, e o jogo de minha vida maior não se fará. Enquanto eu inventar Deus, Ele não existe.


LISPECTOR, Clarice. Felicidade clandestina, Rio de Janeiro: Rocco, 1998.

segunda-feira, 17 de outubro de 2016

solidão cósmica

em algum lugar outra bolha desprende-se,
infinita e eterna,
universo em dez segundos,
filho de um pai sem espírito,
experimento galáctico

onde andaria deus?






terça-feira, 11 de outubro de 2016

desvisto ultrajes
as medidas transbordaram







domingo, 9 de outubro de 2016

eu desfiz tudo pra você gostar de mim





as aparências desenganam







vou pra grécia, nadar no mar egeu
colher marisco e coral, andar de peixe espada
mensagem só por farol ou garrafa arrolhada,
logo me reconhecerás, estou aqui, assino eu
mesmo sombra,
mesmo duplo,
atrás da vidraça
te vi único

quarta-feira, 5 de outubro de 2016

os dias


aí está vaso, terra, esperança e deus
escondidos nos dias
quando não olhas a flor que plantei

os gestos e os objetos

observo a flor
ouço o vento
estendo a mão
danço mambo
canto só
quero muito
não faço concessões

sábado, 1 de outubro de 2016

desconcerto



de um pulo só,
veio o coração do peito,
pela boca saiu de vez,
não houve voz, não houve jeito,
levantou menina e cadeira
frio na barriga, palidez,
isto é coisa que se faça, debandando sem porteira
perseguida pela flecha que nunca erra
alvo que é posto, olhar do moço

da lembrança na retina, te perdes toda noite,
abre o peito, ó menina, deixa o amor pra poesia,
abre os olhos, ó menina, acorda sem fantasia
lembra da lua que dorme de dia
pra que imagines na sombra, outra noite clarear
tantas palavras podem ser luz
podem ser chama a iluminar

sexta-feira, 30 de setembro de 2016

poeminha demente


preciso amar urgentemente
preciso amar profundamente
receita do signo e ascendente
assim diz o vidente
assim ouve a consulente
o amor é feito um ente
deixa sorridente
o mais infeliz vivente
deixa brilho no olho doente
o amor é urgente
diz na carta que não mente
tem um casal se amando docemente
debaixo da lua crescente
diz na carta proponente
se você vier será no poente
no relógio o tempo é crente
vem o dia nascente
diz na carta que não mente
tem um amor pra cada carente
tem o dia e a noite soberanamente
tem no meio uma razão amorosamente
tem no fim uma história novamente

semente

sim, é certo, a velocidade da luz é maior que a do vento
a primavera empurra o ar
em movimento, a claridade voa no dia
o lugar perto ilumina 
e no momento 
brilha no ar o mesmo e sempre eterno tempo,
todo sentimento é profundo, todo canto é melodia
caminhos dizem lugares, amar a semente
até o fim
sim, a palavra permite que se abra o ovo
que se olhe de novo a cara do amor




terça-feira, 23 de agosto de 2016

então quando chegar o tempo de semear
será  fim de inverno
haverá uma terra e um fio de luz
nas mãos, um desenho incerto,
de hera subindo em desatino;
o vento dirá,
num terno abraço a rodar
anda, cigana, vai amar




desdenho de mim mesma
melancolicamente 
portuguesa,
terra desvista 
nau insone
nau fragata
tudo some, orgasmicamente,
quero sair em busca de outro nome

terça-feira, 2 de agosto de 2016

viver uma vida para lembrar,
dia e noite apertar nos braços a memória
com que se alimenta o tempo amoroso das lutas
abraçar os dias e as noites, esperar
como se espera, a esfera dura do tempo
cantar no contratempo, no fio da canção
imaginar que tudo cabe coração,
girar no mundo pequeno da poesia
no universo da palavra dada
que é eterno e brilha em qualquer esquina,
mesmo quando passas sem me notar

quarta-feira, 27 de julho de 2016

sexta-feira, 22 de julho de 2016

ausência

ando em câmera lenta, lenta,
prá trás e sempre indo, sentindo
o lado esquerdo como direito, a mão dada retirada,
o algodão doce melado
na pele salgada desmanchado;
ando e desando na linha imaginária da rima
desfazendo a mala com passagem só de ida,
despregando o que foi colado;
ando esquecendo rápido o riso na madrugada,
apagando a pegada e o toque da mão na cara suada;
ando querendo andar no ritmo de um cordão,
em câmera lenta pra trás e ficar num tempo
saido do coração atento





quinta-feira, 14 de julho de 2016

O canal da vagina exemplar
de quatro a espiar
a cabeçorra negra,
e a boca horizontal
num muxoxo salivar,
Contata o esguicho alvo
da manga a escapar,
via láctea carnal
universo em contração
no imantado buraco


amante natural
expressa o coração
no gesto corporal

segunda-feira, 27 de junho de 2016

o seu eu 
é mais 
muito mais
do que eu vejo 
no jeito despojado 
do seu olhar
vazio no meu

terça-feira, 21 de junho de 2016

óbolo

sou lobo de novo,
caço aos pedaços,
os pequenos e grandes
lábios
de manhã, sono,
boiando no sal,
de tarde, imagem
úmida no lodo,
na noite, o dolo,
penetro na carne,
lanho o óbolo,
até o fim do fundo

sou lobo de novo
caço onde está o coração
afio os dentes no cio
penetro na carne com a pressa da presa
lanho o dano até o fim do fundo
até o fundo de mim



domingo, 22 de maio de 2016

como ficam os sonhos depois de sonhados?
perdem a cor, escapam no vão do dia começado?
passam rentes aos desejos alcançados?


Rêver

na palavra revejo,
como rever fosse não terminar
de pulsar na insônia ancestral,
onde caminho
há sonho

quarta-feira, 18 de maio de 2016

adeus 
minha flor,
e todas as folhas,

junto na mão, a esmo
pétalas e o mundo bom

basta a calma e a imensidão,
iluminada desta passagem

segunda-feira, 16 de maio de 2016


adeus amor da tarde,
e assim me vejo na vertigem do abismo,
cálida carne, antigo som, 

digo medo, 
tremo,
explico à alma o longo dardo, 

eco jogado antes, muito antes, bem antes
sob a luz 

agora na noite, a boa noite, o bom dia, a boa tarde
findam na sorte

na palavra revejo,
como rever fosse não terminar
de andar e andar e andar
onde não há mais 


amor da tarde
assim me vejo na vertigem do abismo
e do silencio,
cálida carne, antigo som

digo medo,
digo desejo,
tremo,
explico à alma o longo dardo

eco jogado antes, muito antes, bem antes
sob a luz,
a mesma luz que brilhou no corpo
amoroso gesto
a dançar no abraço

agora na tarde, a boa tarde, a boa noite, o bom dia
que todos os pássaros cantem a sorte de amar













quinta-feira, 21 de abril de 2016



da minha insofrencia,
a camélia
lenta, rebenta

domingo, 10 de abril de 2016

tem uma tremedeira e uma paz sem fim,
tem sim, cheiro de jasmim e leite azedo, 
e de silêncio, 
escuta dentro de mim
o coração sagrar-se no cimo do espinho
o contrário contradiz o ordinário
a cada minuto defendo uma louca nova
que caminha na brasa e fode o tempo






essa coisa de beijo, boca
que vai deslizando boca pela pele
pequeno ou grande respiro, boca
palmo por palmo, boca, no corpo, na alma
amarrando a corda de carne, boca
balançando ancorada ao grande barco,
fechando os olhos pra não ver, boca
quando o mar levar a santa calma, boca
e a ventania desmanchar a proa









essa coisa de beijo, boca
que vai deslizando boca pela pele
pequeno ou grande respiro, boca
palmo por palmo, boca, no corpo, na alma
amarrando a corda de carne, boca
balançando ancorada ao grande barco,
fechando os olhos pra não ver, boca
quando o mar levar a santa calma, boca

e a ventania desmanchar a proa



segunda-feira, 4 de abril de 2016

céu da semana


Céu da Semana



Perto do infinito, no colo do profundo. Música silenciosa, antes de tudo, antes do antes. Em torno da grande fogueira, grandes e pequenos entoam a canção da eternidade. No ventre da infinita mãe noturna, nascimentos e renascimentos são gestados.

Vênus transita em Áries de 5 a 29/4 trazendo temperos mais picantes, levantando o Fogo e aquecendo o caldo dos afetos. Anuncia novos inícios, anima as interações entre as pessoas, os relacionamentos e os romances. Propõe sua vibe amorosa aos rapazes da banda (Sol e Urano em Áries; Marte e Saturno em Sagitário, planetas em signos de Fogo). Outras são as suas artes, beijos Big Bang. Harmonizar os elementos de dentro e de fora é chave da alquimia, alimento de cada dia.

Depois da correria ariana, o serelepe Mercúrio, mensageiro dos deuses e companheiro dos humanos, movimenta-se no terrestre signo de Touro de 5/4 a 12/6. Lê rastros e entrelinhas, desenha mapas e define caminhos, dando corpo às mensagens que o Fogo arriscou. Super disposto a colocar ideias em prática, traz suas múltiplas habilidades de comunicação e expressão para o plano concreto e visível. 

A Lua encontra o Sol e se faz Nova no signo de Áries (7/4), onde também estão Urano e Vênus. Ímpeto e força rompem espaços, abrem vias e veios, fertilizam ideias e progressos. Aventura e sabedoria devem andar juntas, porém. 

Quando parece mais ausente, sem ser vista na perspectiva da Terra, mais presente a Lua está, conversando com o Sol. Fotografia emergindo lentamente na câmara escura, as revelações do interior serão divisadas aos poucos na evolução do ciclo. 
Rosto com muitas faces, gira a roda da memória nas mãos do Artista de tantos nomes. Seu retrato branco projeta no veludo ultramar do céu o registro da nossa história. 

Será que é para lá que se vão os nossos sonhos depois de sonhados?

molde

a cama cá
sempre
desarrumo
como aqui
estivesse
o corpo lá

quem veio,
dizes
ninguém,
digo
olhando
o registro,
(riso
fora)

as mãos calmas no bolsos
teu corpo,
nervo
impresso
dentro



sem nome

o que me agita é o pensamento,
pequeno coração pulsando
nos teus lugares

o me me sacode é a mente,
atiça o perigo na noite,
e a ausencia no enredo

o que me agita mesmo,
é te inventar,
conceder todo gozo à criação

e o que mais me excita,
neste exato momento,
é oco, é trêmulo, é medo


terça-feira, 29 de março de 2016

domingo, 27 de março de 2016

dia e noite

pesa em cima de mim, sim
leve e fundo,
perturba o dia,
volta com a luz que te ilumina
o sol te conduz pela mão

depois te distancia
é preciso a própria companhia
corpo e alma em descanso
pra que se recomece desde o início,

o ar fresco da rosa de outono
também se inscreve no fogo que alimenta
a noite futura

quinta-feira, 3 de março de 2016

ninho de cordas

as canções me acordam, meu bem
nelas uma chuvinha bate
no compasso, deixa que embale
as cordas vibram, as cordas vivem

as canções dançam no céu e na flor
no chão, no copo, no mesmo quilate
que brilha na liga de ouro do amor
e quem canta leva o espanto e a dor

a palavra diz que tem
ninho de cordas neste andor
troca logo de fio, que som maior
vem da viola de corda nova, doutor


quarta-feira, 24 de fevereiro de 2016

nada deixo, além do lixo que separo
amigos que amparo, poucos
nada fica, palavra louca
os filhos falam por si
sim, falo e não digo,
nem sempre fico


o chão que piso
é o mesmo teu
duro pra mim, macio
às vezes por fim
nunca sou o que esperas
esta é só a casca da quimera
que separo no lixo temporal

na pauta

lua quase em sol,
noite quase dia
olho quase boca, queria
quase canto, canção
dizer na pauta, sol na lua
luz que canta, harmonia
como a noite, me aninha

vem quase meu, toma o corpo
toca a alma
e faz o dia, além
meu bem, meu quase bem
um canto, quase chão
uma sílaba, quase tom
partida de canção





terça-feira, 23 de fevereiro de 2016

os mortos
se vão rapidamente
o fogo não para
queima corpos,
queima tempo,
talvez alma

antes a terra acolhia
antes era um campo santo
agora um estacionamento

já não falo com meus mortos
em quinze minutos vence a vaga,
corpo sem alma, alma sem tempo



quarta-feira, 20 de janeiro de 2016


janeiro

meu sudário
recolhe 40 graus
pouso no
chão fresco da labuta
corredor
onde edifico
o dia que derrete
começo a dizer
o começo é agora
me empurra
sobre a síntese do inferno
criação do dia
este que me cria

aqui, um pedaço

aqui
esqueço mais rápido dia após dia
acatando a existência secreta,
havia um conforto no pátio
na horta do pai.
manhãs de capina, espigas de milho e sol
no fundo, meus irmãos
abriam ovos no galinheiro
a correria atravessava a casa úmida
e se instalava lá fora, no banco do cinamomo,
dentro, mãe e barriga, sinonimia da provação
ano sim, ano não, a secreção divina
obra que resistia por si mesma,
meninos e meninas cirandando
nas antiguidades sem data
da cidade quadrilátera do sul,
existia um banho de lagoa saloba
ardências e sangue na pele pálida
a irmandade voraz resistindo ao sol
pão com banana, tardes de vento,
noite de clube, de bingo, de baile
e a grande mágica iluminada de cada semana,
o cinema, vinha num rolo sagrado, enrolado filme
esperado sapateado rebentado
as figueiras levavam a vida inteira para crescer
além e mais acima, mas sempre estiveram por lá
cobras verdes subiam nas paredes da casa,
aqui
lembro um pedaço que some rápido
como se na balsa andasse
alisando a fluidez do canal
ainda vejo o São Gonçalo
parece longe,
mas não,
é só um resvalo banal
de uma margem à outra da memória

terça-feira, 5 de janeiro de 2016

carne de panela 
fruta no pé
o bule azul com a flor branca
a primeira semente
(o vento varre o céu)
é domingo no prato

tres e um início estranho





um se faz
um outro se adensa
sem
outro indo se despe

redundâncias ficam lá, para lá de lá

na luz da oriente
o estranho deita o primeiro dia


itapoan


no inicio foi separado o céu da terra
e a água da nuvem
ilha e concha flutuaram
na terra que ronca
o pasto apontou
e na luz permaneceu

o caso

oh momento vespertino
diz-me o que fazer...
ler, cantar...
esperar…
meu esqueleto clama pelo canapé
minha alma dança na ponta do pé
os bombeiros estão cansados
a casa da lingua portuguesa ardeu
todas as palavras
a presidenta ascende um ponto
o ministro diz que dá a volta por cima
resgata o bordado
em tempo, é dia do atleta,
três pulinhos pra comemorar,
ai que preguiça...