sexta-feira, 30 de outubro de 2015

saber que as galinhas estão no choco
e a primavera no ovo,
o sol, na esquina, rebenta de novo


terça-feira, 27 de outubro de 2015

sexta-feira, 23 de outubro de 2015

o homem


de tudo que vejo, penso no tempo que passa lento nos corpos desenhados em dez segundos
e nos dez segundos que fixam todo o tempo
no tempo que anda pedaço por pedaço do mesmo jeito, mas que parece ter pedaços mais longos que outros, onde se quer deixar ficar como uma flor num vaso, ou um regaço morno que nos cola na pele
o frio o calor a casa que se estende para o corpo deitar
penso no corpo do homem que morreu esta noite
que sentiu dor que sentiu a eternidade em poucos segundos num leito branco
penso no homem que partiu
no homem que plantava e que colhia, cozinhava e gritava com voz rouca e alta
para alimentar outros homens
penso no tempo que passou, um tempo longo
escolhendo um caminho, uma mulher, uma família, um teto
e todas a panelas e seus longos segundos que se fizeram ferver  experimentando nos temperos do homem um outro tempo
penso no tempo que o homem leu e descobriu segundos menos curtos e horas mais longas
e ficou andando longas distancias para voltar sobre seus passos de aventura e cura
penso no tempo de sol e de água que passava rápido como um acampamento que se faz no caminho
para alcançar outra praia, outra pescaria, outro tempo para descansar
e no tempo em que se fazia o almoço planejando o jantar
e no homem que ficava com os outros homens, nas noites longas, nos jogos de futebol,
nos olhos dos filhos
o homem que foi e voltou oceano a fora, que deitou sobre a areia do deserto
e riu e bebeu e comeu tâmara, o que o caminho plantava, e se admirava de tudo estar no lugar
aqui como lá do outro lado, que o tempo foi bom e generoso
que trouxe frutos, que também arrancou frutos do seu colo e o deixou órfão
penso no homem que trabalhou tanto tempo oferecendo mais tempo para a vida dos seres bichos
e que acolheu aqueles que passaram por sua porta
o homem gritava do seu jeito, ocupava a casa, a rua, a cidade, o mercado
os amigos do homem eram amigos de todos os segundos e em volta de um fogo passaram muitas vidas
o homem se foi, deixou castanha, jabuticaba, carambola, alecrim e manjericão, tudo plantado no chão firme e arejado no ar puro do seu cuidado
o tempo passa lento no início, quando se quer que seja rápido, que a árvore cresça, que se use calça longa e que os olhares vinguem num amor maior
o tempo passa rápido quando a vida com a sua beleza e frescor passa rápida
o homem se foi,
deixou o oásis


terça-feira, 13 de outubro de 2015


vento

o vento arranha o céu
cinza esparrama
empurra a porta 
pra dentro 
pra fora
o vento
corre
nem sabe de quem
louco assobia
fino
e grosso
o vento roda sem trégua,
o lombo da água 
o vento arrepia
pra cima
pra baixo
a onda,
grão de ervilha
o vento esganado
come
até unha roída,
o danado do vento engole
tanto é que soprou
o impeachment
pra amanhã
graças
ao vento
o rádio
o locutor
a midia
tem assunto de verdade



quarta-feira, 7 de outubro de 2015

quero dizer corpo
e digo sopro
quero alinhar
de um golpe só
traço e olhar
ver o que existe
de eterno
entre linha e gesto
o humano gesto
de te olhar
com a ponta do lápis



terça-feira, 6 de outubro de 2015

desenho


há um gesto perplexo
desenhando
há um corpo estático
observando

olho conciso
abraçado
no traço