quinta-feira, 28 de julho de 2011

segunda-feira, 25 de julho de 2011

FLIP





“Quando eu tinha 8 anos veio morar para a casa ao lado da dos meus pais um casal de brasileiros com duas filhas moças. Ao chegar, o casal ofereceu uma ambulância ao quartel de bombeiros da nossa vila e toda a vila se emocionou. Foram os primeiros brasileiros que eu vi fora da tv, fora das novelas. Eu e os meus amigos fomos ao quartel dos bombeiros apreciar a ambulância nova, bem pintada, que se mostrava a todos como prova bonita da bondade de alguém. O meu pai tinha um carro pequeno, velho, difícil de levar a família inteira dentro. A ambulância era enorme, um luxo, como se fosse para transportar doentes felizes. Eu e os meus amigos ficamos estupefactamente felizes.






Depois, algumas mulheres e alguns homens mais delicados reuniam-se diante da senhora e das moças brasileiras e faziam perguntas sobre as novelas. Naquele tempo, passavam com muito atraso em relação ao Brasil, e todos queriam saber avidamente quem casava com quem na Gabriela.

A senhora e as suas duas filhas, porque sabiam o que ia acontecer nas novelas, eram aos olhos de todos como adivinhas, gente que via coisas do futuro, gente que viveu o futuro e que se juntou a nós para reviver o passado. Por causa disto, eram mágicas e as pessoas queriam a opinião delas para cada decisão.


A minha mãe pediu à nova vizinha a receita para fazer pizza, porque ainda não havia pizzarias e só víamos nas revistas como deviam ser bonitos e saborosos aqueles círculos de pão e queijo coloridos pousados nas mesas. Passámos a comer uma pizza de atum com muitas azeitonas pretas. Ainda hoje peço nos restaurantes pizza de atum com a esperança de que seja exactamente igual à da minha infância, mas nunca é.


As moças brasileiras eram mais velhas do que eu e ficaram amigas das minhas irmãs. As minhas irmãs saíam com elas à rua inchadas de orgulho, porque as pessoas todas, sempre comovidas com a ambulância, fazia vénia e sorriam. Havia gente que dizia que as moças brasileiras eram as mais belas de todas. Elas eram, na verdade, sorridentes, e eu senti que também seriam muito felizes na nossa pequena vila.




Um dia a minha imã mais velha fez anos e foi festejá-los com uma festa na garagem das brasileiras. Na noite desse dia, ali pelas oito horas, uma outra menina, filha de um vizinho português, mostrou-me tudo. Não foi a primeira vez, mas eu queria sempre ver, embora ela não quisesse sempre mostrar. Um amigo meu surpreendeu-nos e quis ver também, mas a menina respondeu que não. Ela disse que mostrava apenas a mim porque eu era amigo das brasileiras. Entendi que as brasileiras eram como um toque de Midas que me transformava num menino de ouro.


Aos dezoito, aquele que é o meu amigo mais irmão chegou do Brasil e ingressou na minha escola. Eu instintivamente corri atrás dele. Queria ser amigo dele como se fosse vital para mim. Ele mostrou-me Titãs e Legião Urbana. Eu achava que o Renato Russo ia salvar a minha vida com aquela canção do Tempo perdido. Quando o Renato Russo morreu, chorei muito e passei só a chorar quando ouço o Tempo perdido. Eu não sei se a arte nos deve salvar, mas tenho a certeza de que pode conduzir ao melhor que há em nós, para que não nos desperdicemos na vida.






O Alexandre, esse meu amigo brasileiro, mudou tudo em mim para melhor. Adorava viajar de comboio com ele quando entalávamos as meias mal cheirosas nas janelas para que arejassem durante a marcha. Nesse tempo, o Alexandre ensinou-me a perder aquela vergonha que só atrapalha. Porque os portugueses sempre foram meio envergonhados.

Hoje, temos quase quarenta anos, ele casou com uma portuguesa e tem filhos. Eu, não. Fiquei para tio a escrever romances, e os romances tornaram-se fundamentais na minha vida, como a máquina de fazer espanhóis. Sonhei sempre em vir ao Brasil e vim várias vezes, faltava vir como escritor, publicado e recebido. Pois aqui estou, a Flip fez isso, não esquecerei nunca, sinto que fazem de mim um homem de ouro, agradeço a todos muito por isso".


domingo, 24 de julho de 2011

sexta-feira, 1 de julho de 2011

amante ardente



sou toda morna é hora

mole aberta debaixo da coberta

vem agora eu poderia o segredo da chave te dar

pode guardar eu mentiria

não demora

é noite fria eu nua lua crua

vem agora sou tua é só ligar eu poderia

secreta sou leito e rua

sedenta uivo terna pele arrepia

só tua só teu meu corpo

noite louca sou toda lua sou toda tua

branca fria morna seria

nua tua lua vem agora amor sou sem pudor

debaixo da coberta vem agora

lençol elétrico métrico amante

sou toda nua lua tua